Há muito, muito, muito tempo atrás, quando eu ainda era jovem, eu olhava o futuro como algo tão grandioso, parecia distante e vasto como um campo sem limites. A vizinhança onde eu cresci era vibrante, cheia de vida. A gente, a turma dos “predin” (um condomínio bem grande, cuja maioria dos moradores fazia parte da nova classe média, que vinha dum passado histórico de pobreza severa em grande parte dos casos), acreditava piamente que iríamos conquistar o mundo, não importava o caminho. Parecia inevitável, tipo o Thanos.
Hoje, paro e olho ao redor, vejo que tudo se transformou. A gente nunca imagina que tudo vá se transformar tanto, né? Muito menos imagina no quê esse “tudo” se transformará.
A vizinhança mudou e nós, as crianças de lá, crescemos e muitos de nós nos perdemos pelo caminho. É uma loucura pensar como este lugar, esta cultura, esta época, conseguiu esmagar tantos sonhos.
Exemplos há vários: tem a da Jana, pobre dela, com um futuro brilhante tão promissor, mas deixou a escola e teve filhos cedo, cedo demais, sozinha demais. O Marco ainda tá na casa dos pais, sem trabalho, só no violão e no paiol, sem nenhuma ínfima perspectiva de conquistar nada. O Jão, de tanta dor, remédio e tormento solitário, abriu mão da própria vida. O Brão, morto por overdose. Alberto, emocionalmente dilacerado, cansou de interagir com as pessoas e se isolou, só acorda, trabalha, come e dorme.
Ainda me pergunto: o que aconteceu com a gente? O que fizeram de nós? A realidade veio como um soco, mais cruel que qualquer pesadelo. Será que pesadelo é sinônimo de realidade?
Acho que talvez a gente tivesse alguma chance, mas nada é de graça nessa vida. Para maioria de nós, não é...
É quase impossível não sentir saudade de como as coisas eram, mas lembrar de como era me faz enxergar como acabou ficando e ver isto – muitas das vezes - é sofrido demais, ver como tudo desmoronou dói demais.
É um choque perceber como a vida é frágil, mas ela é. Como sonhos podem se desfazer bem diante dos nossos olhos, mas eles se vão, como castelos de areias.
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(texto inspirado pela música The Kids Aren't Alright, by The Offspring)